VIZINHOS
QUE NÃO TRANSAM
Um
amigo que mora no mesmo prédio que eu, em estado catatônico de “sêmen-pânico”,
veio me pedir ajuda. Ele relatou: “Jayminho, sexta feira passada fui ao
“Carmelitas” tomar uma ceva com uma interessante mulher. Por volta da meia
noite e vinte e oito já estávamos aqui no prédio. Transamos loucamente e o gozo
recíproco foi o índice da felicidade do encontro. Ocorreu que emitimos alguns
sons na expressão de nosso prazer. Nada exagerado, mas, talvez, um que outro
gemido passível de ser escutado no “ap” ao lado. Sai para almoçar no começo da
tarde de sábado e quando retornei havia esse bilhete embaixo da minha porta (anexo
aos comentários). Jayminho, o que eu faço, estou desesperado?! Como assim eu
não poderei mais transar em minha própria casa? Não havia nenhum outro emissor
de sonidos ligado, éramos nós e o silêncio rompido, “volti-e-meia”, pelos
dionisíacos gemidos. Me ajuda, tu podes ser a próxima vitima dos vizinhos que
não transam...”. Sua narrativa durou aproximadamente um cigarro. Já
emocionalmente envolvido com a querela de meu amigo, li o bilhete e disse:
“vamos comprar umas cevas no mercadinho aqui ao lado, dialogar e elaborar uma
estratégia”. Juntos, refletimos...
Primeiramente,
essencial respeitar a dor do outro, ou seja, aconselhei o amigo a pedir
desculpas, caso ele descobrisse e esbarrasse com o tal vizinho. Em segundo
plano, que ele conversasse com o “Zé”, “zé-lador” do prédio, sujeito que tem
acesso a informações privilegiadas no contexto do edifício. E que o papo com o
Zé fosse num tom leve e debochado, fazendo-o compreender e se solidarizar com a
necessidade da cópula, além de fazê-lo rir e interceder positivamente com o
vizinho. Assustador, entretanto, é o tom moral do bilhete. Para além do
incômodo concreto, caso a pessoa estivesse dormindo, parece que o barulho ser
do sexo foi um agravante do delito, na aparente mente conservadora do vizinho. Conversei
com o Zé e ele confirmou que o núcleo da reclamação era o fato dos gemidos
demarcarem a transa. Aliás, há uma jovem e querida vizinha no apartamento bem
embaixo ao de meu amigo, e ela não teceu nenhuma reclamação, muito embora seja
a maior prejudicada no vazamento sonoro do apartamento amigo.
Nesse
contexto, eu e meu amigo bolamos a campanha: “Transem vizinhos!”, pois
acreditamos que se todos do prédio transarem, então haverá mais tolerância com
o gemido alheio, além de que é cientificamente comprovado que o mau humor, por
vezes, é corolário do mau amor. Nesse ínterim, lembrei-me do grande livro “Eros
e civilização”, no qual Herbert Marcuse defende uma sociedade menos repressora
com relação às pulsões libidinais. Puxa vida, seria lindo vivenciar a
implementação dessa utopia erótica no habitat cotidiano. Fica o apelo: transem
vizinhos!
Jayme C.
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