quinta-feira, 9 de outubro de 2014

eleição, política & politização

Qual o grau de politização dos gaúchos? Ou diálogo com um maranhense

Aqui no Maranhão uma pessoa me perguntou sobre as eleições para o Rio Grande do Sul. Meu interlocutor indagou-me se o gaúcho é um povo politizado. Daí, eu descrevi o resultado das eleições e deixei que ele próprio compreendesse a politização dos gaúchos.
Esse não é um argumento petista. Tampouco, uma crítica ao antipetismo, mas uma tentativa de interpretação de fatores da politização dos gaúchos a partir do resultado democrático concreto. Portanto, tentarei ao máximo evitar pré-concepções idealistas sobre o resultado acontecido.
O deputado federal mais votado, Luiz Carlos Heinze, revela em sua expressiva votação que representa uma considerável parcela do povo gaúcho.  Em uma audiência pública realizada no município de Vicente Dutra, em novembro de 2013, Heinze afirmou que "quilombolas, índios, gays, lésbicas são tudo que não presta". E esse é um dado conhecido de grande parte da população gaúcha. Ora, não podemos ser ingênuos como recentemente FHC o foi ao afirmar a desinformação de quem não pensa como ele. Foi amplamente divulgada nos meios de comunicação essa atitude de Heinze. As pessoas que votaram nele, de alguma forma, realmente acreditam que "quilombolas, índios, gays, lésbicas são tudo que não presta". Eu penso radicalmente diferente. Porém, sei que têm milhares de gaúchos no interior e na capital que pensam assim. Em nossa jovem democracia parte da população gaúcha acredita que o discurso de Heinze os representa. Por essa razão, votaram nele. É um exercício de olhar para dentro do que somos, enquanto povo, mesmo que nós e nossa “timeline” no Facebook consideremos até mesmo criminoso o discurso de Heinze. Repito: não podemos tolamente acreditar no desconhecimento do outro. Os próprios adversários de Heinze ocuparam-se em difundir as suas ideias e visão de mundo.
Da mesma, forma, a eleição de Jardel, apadrinhado politicamente pelo ícone do PSD no Rio Grande – Danrlei. Por isso, primeiro acho justo nos indagarmos qual o grau de cidadania que Danrlei demonstrou enquanto figura pública do esporte. Ora, se Dunga se candidatasse eu compreenderia a sua possível eleição, já que ele demonstrou, durante a sua trajetória, práticas e discurso isonômico, virtudes que me parecem importantes para um representante parlamentar. Danrlei, entretanto, passou há léguas disso.
Os cientistas políticos alegam ter sido o voto dos torcedores que elegeu Danrlei. Fico imaginando se os torcedores que votaram no arqueiro gremista, não são parte daqueles que “morrem pelo seu time”. Torcedores que, normalmente, afloram facetas selvagens dentro dos estádios de futebol. Danrlei se reelegeu e levou na carona Jardel, sujeito que tampouco teve domicílio eleitoral no Rio Grande do Sul na maior parte da sua vida. Um dado óbvio sobre a eleição de Jardel: o candidato escolheu o Estado do clube onde ele foi ídolo para concorrer ao pleito. Entretanto, novamente é importante destacar que Jardel e Danrlei representam parte dos gaúchos. Acho frágil em nível de cidadania ir às urnas no domingo da eleição e votar como torcedor e não como cidadão. Porém, essa é apenas a minha leitura.
O senador eleito Lasier Martins é o caso mais polêmico. Muitos o odeiam e muitos o amam. Tendo em vista as manifestações (reais e virtuais) que ambos os lados fizeram, a adjetivação entre o amor e o ódio cai como uma luva ao senador. Detentor de repulsa pelos cidadãos de esquerda foi aclamado nas urnas como o escolhido dos gaúchos. É quase unanime que a sua candidatura foi alavancada pelos anos de exposição na RBS. Acho que esse é o ponto, como nos casos acima. Qual o estofo político que Lasier manifestou enquanto jornalista? Lasier demonstrou cidadania em suas práticas e análises jornalísticas? Foi à primeira eleição de Lasier. Assim sendo, seus eleitores votaram no jornalista famoso e não em uma possível trajetória política que neste caso, nem sequer foi construída ainda. Lasier Martins representa pelo menos dois milhões de gaúchos.
Acredito que os exemplos analisados podem ser um Norte sobre o discurso fundante de milhões de gaúchos, povo que avoca cotidianamente a tese de ser o mais politizado do país. Não saberia dizer se isso é verdade ou não, afinal, trata-se de uma questão complexa demais para essa breve crônica. Aliás, voltando ao meu interlocutor maranhense, este descreveu o que vivemos aqui no Maranhão: depois de 50 anos a família Sarney perdeu uma eleição, confirmando a minha ideia de que atualmente as pessoas sabem quem são os seus representantes. Nesse horizonte está recolocada a questão: e os gaúchos – sabem qual o seu grau de politização?

Jayme Camargo

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