segunda-feira, 6 de junho de 2011

carta dos direitos humanos


Mudar é difícil, mas é possível.
Paulo Freire


Carta aberta de uma mãe em defesa de um filho: a “declaração materna(l) dos direitos humanos”

Caro filho, quem te escreve é tua mãe. Aquela que te colocou no mundo. Que tentou te cuidar enquanto pôde. E que não mais podendo, cuidou que a ética do cuidado fosse re-memorada entre os homens. A ética que as mães têm por seus filhos – do cuidado pelo amor. Tu, meu filho, deverias ser reconhecido entre os homens. Quando finalmente os direitos serão “humanos, demasiado humanos”?! É minha pergunta para tais “homens”. Que te levaram de mim, porém agora te abandonaram no mundo. Eu, na qualidade de tua mãe, jamais fecharia a porta para a tua entrada. Jamais te deixaria na rua, jamais te deixaria jogado. Olha os homens des-humanos, ciborgs de coração gelado, que te rejeitam à sarjeta... Acorda meu filho! Olha para o que fazem contigo no cotidiano... Olha para como as pessoas esquecem o teu ser. Esquecem a tua existência. Olha o que fazem com aquilo que lhes parece diferente. O olhar que as pessoas executam quando olham para a diferença. Os homens te executam ao executar a diferença. Olha para aqueles que se amam e que não tem liberdade para poder amar. Tão somente por causa de alguma diferença na composição dos pares. És esquecido e assim pessoas que se amam são discriminadas por se amar. És duplamente executado quando pessoas “selecionadas” pelo sistema das grades, são destruídas subjetivamente pela seletividade. Sejam grades de condomínio, ou grades de “penitencia-diária”. Olha e não te engana, meu filho, os homens continuam brigando por motivos de cor. Continuam no dualismo pré-conceituoso entre o escuro e o claro. E assim eterna-mente perdem a beleza dos arco-íris. Os homens, tolos reféns dos objetos, lutam por seus egos. E assim também és executado... Olha o que os homens fazem contigo, em nome de algo que eles próprios definem como o “normal”. Passei a vida querendo encontrar o tal “normal” e acabei muitas vezes perdendo minha própria história. Eu reconheço – meu amado filho – que também erramos. Que muitas vezes em teu nome cometemos alguns atropelos. Sabes como são as mães, não medem esforços para verem seus filhos se desenvolvendo... Por isso mais essa súplica. Mais esse texto. Testa a tua retirada como a abertura para um re-começo. Como a abertura de um reconhecimento. Ou, alternativamente, voltas para casa. Sai desse mundo se ele não demonstrar que te mereça. No seio de tua mãe aos teus filhos não faltará leite. À tua vida não faltará diferença. Ao teu histórico espírito não faltará memória na guarida. Guarda a tua própria vida - é o que te peço. Não imaginas o que seria para a tua velha mãe Vida, ter que presenciar ao teu enterro. Na des-humana terra em que ainda reina o preconceito. É mais difícil quebrá-lo do que quebrar um átomo, disse Einstein no ensejo. Talvez, meu filho, esta seja a "partida". O começo pela quebra do preconceito. Escreverei para que os homens o destruam. Pois será a tua vida que estará em jogo. Não quero te perder mais em guerras, em viadutos, em guetos, ou, favelas. Não quero mais te perder por questões de gênero. Tua gênese é tua própria natureza; e teu sonho – deuses. Sonho contigo saudável no cotidiano. E assim me faltam palavras. Restam-me soluços, lágrimas e desespero. Como tua mãe, sinto as dores do sofrimento de todos aqueles que não têm acesso. Ace(n)ssibilidade como um todo. É o “outro” como respeito. Um casamento com a alteridade. Ela é o amor que te desejo. Ela te dará a saúde na doença. O amparo na justiça. Um lar para tua vida. A tua vida é a minha maior pré-ocupação. Deves saber que Não há problema maior para uma mãe do que a vida de seu filho. És um pedaço de mim. Assim, és a vida desta velha senhora Vida. Tu, “Direitos Humanos”, meu amado filho, és a própria vida desta velha história chamada Vida...

Porto Alegre, sexta-feira 3 de junho de 2011.

Jayme Camargo da Silva

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