Fui a Buenos Aires com um grupo multicultural. Éramos brasileiros, japoneses, chineses, hondurenhos e espanhóis. Não vou nem falar do charme e “interessância” da cidade, pois tal – outros com mais gabarito sabiamente já o fizeram. Falarei de uma festa não menos multicultural que acabei fazendo. Essa noite havia começado cedo. Eu e o pessoal com o qual viajei tínhamos ido a um lugar pouco antes de “Palermo”. Era um domingo à noite. A festa era de hip-hop. O lugar me (a)pareceu de dois modos. Primeiro com o que ele pretendia ser, ou seja, seu projeto era ser uma espécie de “elo perdido” – lugar em que rolavam festas interessantes na rua Garibaldi no fim dos anos 90. Do outro modo, vi o lugar como aquilo que se tornou, ou seja, conforme seus habitantes, músicas e práticas, isto é, parecia estar no “Gê Powers” – bar de black music também na província da virada do milênio. Acabamos voltando para o hostel umas 3 e meia da manhã. Todos foram direto para os seus quartos. Eu, de outra banda, fui comer meu sagrado alfajorzinho antes de dormir. Em Buenos Aires é sempre de bom tom comer um alfajorzin antes de dormir... Torna-se mais fácil sonhar com os anjos. E não deu outra: com um anjo me encontrei. E acabou não sendo no sono. Antes pelo contrário, acabou sendo um sonho.
Ouvi ruídos e vozes ao fundo do hostel, enquanto preparava para me retirar ao leito. Resolvi, no melhor estilo Bial, dar uma “espiadinha”. Assim, avistei uma festa rolando na cozinha/salão de festas. Fui prontamente convidado a me juntar ao grupo, por um menino americano chamado “Ethan”. Ele era da Califórnia, mas estava morando em Buenos Aires. Olhei a festa mais de perto e logo diagnostiquei – havia apenas 3 meninas e um bando de “cuecas”. Uma delas misteriosamente sumiu pouco depois que eu me aproximei. Uma outra estava com uma criança e um “magrão” a tira-colo pajeando a sua atenção. A terceira estava em um grupo que tinha bolivianos, argentinos, americanos e espanhóis. Ela falava constantemente e em espanhol. Era uma gatinha. Fiquei uns 28 minutos naquele chove-não-molha e estava praticamente abortando a missão. Quando de repente a bela garota que falava espanhol interrompeu uma fala no grupo que estava ao meu lado, e fez uma interjeição em português. Olhei para ela com alegria na retina e disse: “Tu fala português?!”. E ela também com alegria e surpresa respondeu: “E você também. E bem!”. Daí eu disse que era brasileiro, de Porto alegre, e indaguei de onde ela era aqui no Brasil. Ela disse que era mineira. Eu perguntei se de “BH”. E ela falou que não, referindo que era de Varginha. Quase sem pensar estiquei o dedo indicador direito e com uma voz roca declarei: “ET telefone minha casa”. E ela reciprocamente parodiou meu gesto e minha fala. E completou dando um lindo e largo sorriso: “que coisa boa falar com um brasileiro”. Seu nome era Thais. Estava há alguns dias em Buenos Aires e se sentia um pouco só naquela noite. Ethan, percebendo nossa sincronia nas metáforas de nossa língua, aproximou-se de nós, e abraçando Thais, tacou-lhe um beijo. Era um beijo do tipo – “olha aqui, ela já está ficando comigo, sai para lá...”. Eu fiquei dividido entre o encantamento pela menina da cidade onde os ets foram supostamente vistos, e o respeito pelo gringo que me havia sido gentil.
Conversamos mais meia hora quase que apenas um com o outro e o encantamento felizmente era compartilhado pela mineirinha. Ela tinha uma sensibilidade legal e também era inteligente; ou seja, “nos achamos”. Quase que juntos propusemos um ao outro sair daquela festa e ir caminhar pelas ruas de Buenos Aires. Desejávamos flanar com uma liberdade que as ruas de “Amsterdam” melhor aceitariam. Uma dupla liberdade, aliás, pois um beijo entre nós era algo premente. Pois, ela recolheu seu agasalho e sua bolsa, deu “adiós” a todos, e saiu de mão dada comigo. Ao cruzarmos a porta do hostel (que se chamava Tango) nos beijamos com vontade. Ganhamos a madrugada de Buenos Aires juntos. Fomos cantarolando até a rua “nove de julho” e lá começamos a cantar e dançar: “quando cheguei tudo/ tudo/ tudo estava virado/ apenas viro-me-viro/ mas eu mesma viro os olhinhos/ só entro no jogo porque/ estou mesmo depois/ depois de esgotar o tempo regulamentar...”. A menina dançou. E foi lindo. Senti-me como uma espécie de Al Paccino pós-moderno em um “perfume de mulher” à brasileira. Nada mais tupiniquim que um “viro-me-viro” para efetivar um afeto.
Jayme Camargo da Silva - primavera de 2010
28 minutos de olhares voltados ao que seria conhecido como FELICIDADE!!!!
ResponderExcluiradorei!!
bjo bjo bjo
adorei...amor em buenos aires tem tudo pra dar certo! espero que tenha durado...bjsss
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