Um olhar para o que se tem
Quando perdemos algo é forte a
tendência de ficar obsessivamente pensando no que foi perdido. E parece ser uma
tônica na vida perdermos pessoas (por mortes morridas), amores (por mortes
sofridas), trabalhos (por cortes que não deixam saídas)... Enfim, até amigos
perdemos, tendo em vista o modo como aconteceram
as caminhadas da vida. Nesses momentos em que estamos no mar turvo das derrotas,
colocamos no mais pleno esquecimento o resto todo. Aliás, entramos em um jogo
constante entre o resto do Mundo versus aquilo que não temos mais. E o nosso
cego apego ao que perdemos nos coloca jogando ao seu lado, no vazio herdado.
Enquanto isso, o resto do mundo
continua existindo cheio de possibilidades e de experimentações concretas de
coisas que não fizemos anteriormente. E mais, é o que temos, sobretudo em face
daquilo que se foi. Ou seja, é no mínimo razoável que tenhamos a lucidez de
olhar para o todo. Além disso, há uma
parte muito especial nesse todo que é a das nossas construções. Isto é, o
aconchego da nossa própria casa, que permite ser um porto agradável e seguro em
meio às tempestades; os amigos que cultivamos e que nos brindam com a plenitude
do amor fraternal; a delícia que é trabalhar com algo que nos toca o coração;
os amores lindos que vem e que vão.
Talvez, o grande detalhe seja o
tempo, ou seja, refletir e tentar chegar à resposta se era o tempo certo para
se perder o que foi perdido. Essa avaliação é difícil, mas pode nos conduzir a
melhor elaborar o luto, ou enxergar que não está morto aquilo que ainda vive.
Lançar um olhar para o que se tem... Pode nos tornar mais leves, melhor
humorados e com a confiança ressignificada. Afinal, como apontou um filósofo
alemão, “o possível é sempre mais fecundo que o real”.
Jayme C.