quarta-feira, 28 de novembro de 2012


A coisa ficou russa

Fui ao Pé-palito (pé-pa) com um grande amigo que havia ficado solteiro. Esse amigo ficou apenas uma semana em liberdade provisória. E foi o suficiente para que realizasse um estrago na província. Logo ao entrar no pé-pa acabamos nos perdendo. 40 minutos depois nos reencontramos e havia duas garotas consigo. Uma delas se chamava Gi e era um antigo affaire seu. A amiga de Gi, por sua vez, meu amigo disse que era russa, que só comunicava-se em inglês, bem como que era para eu dar um jeito nela. Sem titubear passei a rasgar a mina com o meu inglês basic mode. Tentei dialogar sobre aspectos da cultura russa que eu conhecia. Assim, entre falar sobre Oleg Salenko – artilheiro russo da copa dos EUA em 94, ou, sobre Dostoievski, preferi arriscar no mestre da literatura. Ela nem deu bola para o meu argumento intelectual. Gesticulando me mandou deixar de ser o idiota, pois senão meu castigo seria não conseguir o crime que homens ordinários e extraordinários executam pela noite... Enfim, começamos a ficar e nem uma hora após o nosso primeiro beijo começávamos o deslocamento para a residência pós-moderna da querida juju. Na época eu servia de caseiro para a juju, pois ela passa parte de seu tempo voando pelo mundo. Bem, fomos ao quarto de hóspedes e nos entregamos ao dionisíaco. Lá pelas 8 da manhã, pouco antes de nos despedirmos, perguntei seu nome e algum meio de contato. E não tinha como não pedir. Foi como ser o ator principal de um filme de sacanagem que a atriz principal tem como fala constante: “Oh, yeah, yeah... Oh, yeah...”. Qual homem nunca sonhou com uma gringa e gemidos internacionais? Ela revelou que se chamava Luana e que como era casada preferia terminar o nosso breve relacionamento naquela manhã chuvosa. Disse também, aliás, que morava em São Paulo. No outro dia comentei o ocorrido com meu amigo Lucio. Ele sem pestanejar interjeitou: “puxa vida, uma russa chamada Luana?!”. Não dei bola para o deboche que rolou – “Jayminho pegou uma russa paraguaia!”. Um mês se passou e fomos a um churrasco na casa do Fred. Narrei à história da russa e assim fomentei a gargalhada dos amigos. Entretanto, Aline Medina pontuou que conhecia a irmã de uma amiga nossa que tinha uma amiga chamada Gi, que mora em São Paulo, se chama Luana e adora fazer brincadeirinhas com os meninos na noite. Ela volti-e-meia se faz de muda ou de estrangeira, e assim tira uma onda pelas noites da província quando está por aí. Verificamos nos contatos de Medina e não deu outra – Luana era a russa! Demos muitas risadas da coincidência. Não costumo citar nomes, mas Luana deixou na reta... Literalmente! Assim sendo, sigo com Dostoievski, no horizonte dos “Irmãos Karamazóvi”, acreditando que todo criminoso cria a sua própria condenação. Seja ordinário(a) ou extraordinário(a). Daí é uma questão de sorte...

Jayme Camargo

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

província em pauta

O provincianismo dominante em Porto Alegre

Na província de Porto Alegre se o sujeito não é bonito, rico, da RBS ou com um sobrenome que revela uma família tradicional na ascendência está fodido. Não tem acesso as coisas boas. Se não é bonito, então lhe falta sexo. Se não é rico, faltam as mercadorias de qualidade. Se não é da RBS, ninguém lhe enxerga. O sobrenome garante um CC no tribunal de (in)...
justiça ou algo nesse sentido. Quando venho com esse argumento, sempre tem um chato para retrucar: “é assim em todo lugar”. Talvez seja. Entretanto, como sou natural da província é lá que posso perceber e descrever o fenômeno. Quando um ex-provinciano como eu começa a conhecer outros lugares, essa condição reluz no imaginário. Reafirmo: o conhecimento de outros locais faz com que você enxergue o seu local de origem de um modo mais preciso. É a grande lição que o cosmopolitismo pode assegurar. Lembro com nostalgia uma noite em idos de 2006 que o velho amigo Marcelo Giulian, com a sagacidade costumeira caracterizou-me como um cosmopolita que nunca havia saído da província. Faltavam recursos. Sobrava a fome pelos livros. Enquanto não viaja pelos céus do Brasil, assegurei-me de conhecer as coisas através das viagens que a literatura proporciona. Foi ótimo o curso em que as coisas aconteceram. A leitura me possibilitou a escrita. As recentes viagens à confirmação de que a província é de fato provinciana, ou seja, em geral um lugar fechado. Um lugar no qual as pessoas em geral saem apenas para encontrar quem elas já conhecem. Um lugar que se orgulha de uma revolução esfarrapada de burgueses safados, escravagistas e loucos pelo lucro oriundo do charque. E que fique claro a regra do jogo social provinciano: ou você é isto ou você é aquilo. Deus o livre não pertencer apenas a uma tribo. Deus o livre ter muitas coisas diferentes constituindo a sua subjetividade. A diferença e o novo geram a desordem no imaginário dualista dos provincianos. É necessário cultuar o padrão. Seguir o padrão. Ser “normal”. E ficar bem quietinho para não contestar o status quo vigente nas pequenas cabeças provincianas. Vão me chamar de ressentido. Me junto a um de meus amigos e mestre, Juremir Machado da Silva, que também é por vezes taxado dessa forma. É o preço de quem não se cala na provocação constante dos provincianismos ultrapassados. Ademais, não sou bonito, mas tenho uma namorada linda que me ama. Não sou rico, mas estudei o suficiente para ter uma carreira que me garanta financeiramente. Não sou da RBS e agradeço por poder debochar livremente de figuras “midíocres” como Lasier Martins e outros que tais. Orgulho-me de minha família. Aliás, para os que se sentirem agredidos, é hora de repensar suas práticas e investigar uma possível mente fechada. Para os outros, vamos rir e debochar de nossas mazelas originais e originárias.

Jayme Camargo da Silva, Rio de Janeiro, 01/11/2012, 04 e 11 da manhã.